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quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

O lado do rolezinho que ninguém discutiu

Nas últimas semanas a discussão que tomou conta do país, como todos sabem, foi sobre o rolezinho. Mas basicamente o que se discutiu a respeito foi sobre se é certo ou não esse encontro coletivo em shoppings, se a polícia e shoppings agiram corretamente, se o governo federal deveria se posicionar a respeito do fenômeno ou ainda se o caso poderia ser tratado de um “apartheid social” como alarmavam alguns esquerdistas. 

Sobre os assuntos que tomaram conta da imprensa, blogueiros, facebook e discussões de bar, tenho minha opinião formada, mas o ponto que quero abordar sobre o assunto é um pouco diferente e que neste momento acho até mais importante do que os discutidos até então. Longe de polícia, apartheid ou shoppings. Acho que a discussão que temos que ter é sobre o tipo de juventude que construímos e continuamos a construir ao fecharmos tanto tempo nossos olhos para esta galera.

Comento isso porque realmente penso que esta galera é vítima de sua própria ignorância, patrocinada por um país que caga para a formação humana. O resultado não poderia ser muito diferente:
Vemos nestes rolezinhos um monte de gente que já nasceu sob a batuta do Plano Real e por isso, na teoria, sob o comando de um novo Brasil, onde já se instaurava o sistema político democrático, moeda estável e arrecadação galopante. Estes jovens já nasceram na era da informação e com o mundo começando a navegar pela internet.
Pois bem, este mesmo coletivo de jovens brasileiros está falando um português sofrível, se importando muito pouco para formação acadêmica, profissional e dando um nível de importância extremamente elevado a símbolos de status efêmeros.

É sintomático o fato de toda uma geração de jovens de periferia querer rebolar a bunda, querer andar de “nave” e ter um extremo mau gosto, até mesmo atrasado, sobre o que se deve usar e o que vai definir se o jovem é descolado ou não. Não consigo entender como estes jovens podem achar bonito e pior, na moda, um óculos do modelo Juliet da Oakley. Provavelmente estes jovens elegeram este modelo como símbolo de status apenas por ser caro. Levanto este ponto porque lembro perfeitamente que estes óculos foram hit no resto do mundo lá pelo verão de 2001 a 2003. Chamo atenção para este “atraso” por ele ser sintomático e simbólico: vivemos numa outra sintonia, num outro ritmo, num outro país, nossos jovens de regiões mais periféricas estão muito atrasados em termos de formação e em termos de postura. O óculos antiquado é apenas um ícone que demonstra este atraso. A “elite” brasileira acha que o Brasil é trendy, moderno e se mantém como um dos lugares interessantes no mundo. E talvez seja mesmo. Mas dentro deste país de mentira, após atravessar a fronteira dos bairros mais centrais e ricos, existe um outro país onde usar “Hollister”, “Oakley” e “John John” eleva o seu status, onde é bonito ostentar marcas e modelos que são extremamente acessíveis e batidos em outros lugares.

O fenômeno do rolezinho mostra que pela primeira vez na vida esse pessoal teve acesso à informação, mas mostra o atraso de prioridades na vida. Muitos preferem gastar seu salário num tênis Mizuno de corrida que nem deveria ser um objeto de uso no dia-a-dia, do que investir este dinheiro em educação, em formação, enfim, em se tornar uma pessoa mais completa. Investir naquilo que realmente podem os levar a voos maiores.

A reportagem da UOL (assista aqui) com jovens de 17 anos falando “nois vai”, “nóis fica”, “aí é zica esses xopim” e “feicibuqui” não relata apenas que a periferia está começando a mostrar a cara, mas escancara como os serviços públicos simplesmente não chegam até lá e se chegam, são da pior qualidade.

Todo este mau gosto, maus hábitos, a ideia de ter dinheiro sem ter que lutar para isso, a famosa ostentação, mostra faces de um país que pecou na formação básica de seus cidadãos. Jovem desta idade deve sim pensar em beijar, transar, se divertir, como qualquer jovem, mas a incapacidade de ver dois passos à frente me preocupa como próximos passos do país, pois é um fenômeno de massa. A facilidade como as meninas se impressionam com o rapazinho só porque ele está vestido de “Aeropostale”, me entristece, na verdade. Pois mal sabe ela que em outros lugares se vende esta marca de baciada em alguma ponta de estoque por equivalentes a R$ 10,00. Talvez se estes jovens tivessem a oportunidade de entender isso, não seria mais bacana usar tais marcas.


Precisamos agir rápido, esses filhos do Plano Real, do “novo Brasil” mostram apenas que ainda somos apenas aquele velho país, aquela velha vila onde milhões são excluídos. Antes de comida e de condições mínimas de sobrevivência. Hoje a exclusão veste Oakley e infelizmente não percebe que foi o descaso do país que fez seu senso crítico focar em assuntos e gostos efêmeros e vazios. Se fôssemos melhores, estariam voltado a algo mais construtivo.

2 Comentários:

Dragocinovic disse...

E digo mais... com essa negócio da "cultura da ostentação" na moda.. só há 2 maneiras de ficar rico de maneira fácil de uma hora pra outra. Se transformando em um artista (no caso mais específico, cantor de funk) ou por meio do crime. O que você acha que a maioria deles vai fazer pra comprar o tal do Juliette!?

Anônimo disse...

Ostentação não é coisa de Classe C. É coisa de Brasileiro. Está em qq classe. Eles apenas copiaram das classes mais privilegiadas.

Gastar dinheiro que não têm, para comprar coisas que não precisam, para fingir uma coisa que não são, para impressionar pessoas que não gostam.

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